A promessa de um paraíso natural em Uberaba
O coração
do Triângulo Mineiro pulsa em ritmos que misturam tradição e inovação. Uberaba,
conhecida pela pecuária, pelo legado de Chico Xavier e por sua história no
interior de Minas Gerais, agora começa a ganhar notoriedade por uma vocação
diferente: o ecoturismo. A criação e a consolidação do Geoparque Uberaba —
ainda em processo de estruturação — têm aberto espaço para novas experiências
de aventura, que vão muito além da contemplação: trilhas, cachoeiras escondidas
e encontros inesperados com a fauna e flora locais.
Para os
profissionais entre 20 e 50 anos que buscam equilíbrio entre rotina urbana e
contato com a natureza, a região oferece um convite tentador. Mas, como em toda
promessa de paraíso, há contradições. Entre a beleza natural e o potencial
econômico, o desafio é transformar a vocação em realidade sustentável.
O crescimento do turismo de natureza em Uberaba
Nos últimos
cinco anos, Uberaba tem registrado aumento significativo na procura por
atividades ligadas ao turismo de aventura. Dados da Secretaria Municipal de
Desenvolvimento Econômico e Turismo mostram que a oferta de produtos e serviços
voltados ao setor cresceu cerca de 22% entre 2019 e 2024. Guias
credenciados, pequenas agências de ecoturismo e até pousadas familiares
adaptaram seus pacotes para receber visitantes interessados em experiências
autênticas.
Um estudo
da Associação Brasileira das Empresas de Ecoturismo (ABETA) reforça que o
Brasil tem um mercado em expansão: mais de 18% dos turistas nacionais já
incluem atividades de natureza em seus roteiros. Uberaba, apesar de ainda
figurar como emergente nesse cenário, começa a captar essa fatia do mercado —
embora com dificuldades para competir com destinos consolidados como Capitólio
(MG) ou a Serra da Canastra.
Trilhas que contam histórias
Explorar o
Geoparque é mergulhar em narrativas geológicas e culturais. Caminhadas que
atravessam formações rochosas milenares revelam fósseis, rios cristalinos e
vegetação típica do Cerrado. Uma das trilhas mais procuradas é a do Vale dos
Dinossauros, onde visitantes podem caminhar entre sítios paleontológicos
que já revelaram fósseis de espécies únicas.
“Quem vem
para cá busca mais do que exercício físico, procura conexão com a história da
Terra. A trilha é um livro aberto sobre milhões de anos”, explica João
Marcos, guia de turismo especializado em aventura.
Mas, junto
ao fascínio, há dificuldades: sinalização precária em alguns trechos,
infraestrutura insuficiente de apoio e a necessidade urgente de políticas de
conservação.
A força (e os limites) da economia local
Para
entender os impactos econômicos, ouvimos comerciantes que têm sentido o reflexo
direto do novo perfil de visitantes.
“O
movimento cresceu, sim. De uns três anos para cá, muita gente chega perguntando
por trilhas, pontos de cachoeira e até por aluguel de bicicleta. Isso ajudou a
aumentar as vendas de equipamentos esportivos e até lanches naturais”, conta Maria
das Graças, proprietária de uma loja de conveniência próxima ao Parque do
Jacarandá.
Apesar do
otimismo, Maria destaca o desalinhamento entre expectativa e realidade: “O
público vem, mas nem sempre gasta como em outras cidades turísticas. A economia
do país pesa, e isso limita o consumo”.
Esse relato
expõe um dilema: há entusiasmo e potencial, mas o retorno financeiro ainda não
corresponde ao investimento que muitos pequenos empreendedores precisam fazer.
Segurança: os riscos reais por trás da aventura
Se as
trilhas oferecem beleza, elas também escondem riscos.
“A maioria
dos acidentes que atendemos envolve despreparo: turista sem guia, sem kit de
primeiros socorros e sem noção do clima da região. O Cerrado é traiçoeiro, muda
rápido”, alerta Sargento Paulo Henrique, da equipe de segurança
ambiental.
Segundo
ele, o número de ocorrências de resgate em áreas de trilhas cresceu 15% nos
últimos dois anos em Uberaba. Para minimizar riscos, parcerias entre Corpo
de Bombeiros e guias credenciados são discutidas, mas a falta de recursos
públicos dificulta a implementação de medidas permanentes.
Experiência radical: a voz dos guias profissionais
No campo da
aventura radical, a vivência é a melhor conselheira.
“Quem vem
para cá precisa entender que a experiência é incrível, mas exige preparo. Já
tive casos de turistas que subestimaram o calor do Cerrado e desistiram na
metade da trilha. Minha dica é: nunca subestime a natureza”, afirma Rodrigo
Vieira, guia de turismo credenciado com mais de 15 anos de experiência.
Rodrigo
recomenda planejamento e respeito ao meio ambiente: “Traga sempre água extra,
use calçados adequados e, principalmente, não deixe lixo pelo caminho. A
aventura só é completa quando a natureza permanece intacta”.
Entre liberdade e instabilidade econômica
O
crescimento do setor é visível, mas o país vive uma fase de instabilidade que
impacta diretamente o turismo de aventura. Para quem investe, o cálculo é
delicado: pacotes que deveriam custar entre R$ 300 e R$ 500 por pessoa acabam
sendo negociados por quase a metade, diante do poder aquisitivo limitado do
público.
Essa tensão
entre investimento e retorno gera desgaste em empreendedores, que precisam
equilibrar custos altos (equipamentos, seguros, treinamento de guias) com a
dificuldade de atrair clientes dispostos a pagar o valor justo pela
experiência.
O que está em jogo: futuro ou ilusão?
O Geoparque
Uberaba está diante de uma encruzilhada. De um lado, há a chance de
consolidar-se como destino relevante de ecoturismo, integrando ciência,
aventura e sustentabilidade. De outro, há o risco de se perder em promessas não
cumpridas, infraestrutura insuficiente e descompasso entre oferta e demanda.
Para os
visitantes, a experiência pode ser transformadora — um mergulho em paisagens
únicas e histórias milenares. Para os gestores públicos e privados, é uma
oportunidade de pensar o turismo não apenas como fonte de renda, mas como
política de desenvolvimento sustentável.
BOX – 5 Checklists Essenciais antes de se Tornar um Turista de
Aventuras, Trilhas e Natureza
1.
Escolha o equipamento certo para sua aventura (calçados de trilha, mochila leve e roupa adequada).
2.
Verifique a previsão do
tempo: no Cerrado, tempestades podem surgir de
forma inesperada.
3.
Leve um kit de primeiros
socorros e saiba como usá-lo.
4.
Informe alguém sobre seus
planos e seu trajeto antes de sair.
5.
Nunca viaje sozinho em áreas
desconhecidas — a companhia aumenta a segurança.
Conclusão
A paisagem
do Geoparque Uberaba é um convite ao desbravamento. Trilhas que ecoam
histórias, cachoeiras que refrescam e fauna que surpreende. Mas cada passo
exige consciência: não apenas ambiental, mas também econômica e social.
O futuro do
ecoturismo em Uberaba dependerá da capacidade de unir forças — poder público,
iniciativa privada e comunidade — para equilibrar o fascínio da aventura com a
responsabilidade da preservação. Afinal, a verdadeira conquista não é apenas
desbravar a natureza, mas garantir que ela permaneça viva para as próximas
gerações.


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